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quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Crianças pequenas e crianças Grandes (2 de 3)

Durante minhas férias, em julho, passei 3 dias não consecutivos na casa de minha avó materna, em Buriti Alegre – GO: dia 21, antes de irmos para Caldas Novas, e dias 25 e 26, retornando de Caldas e antes de eu voltar para a rotina de Brasília. No dia 21, assim que chegamos nos deparamos com um morador inesperado: Pablo. Pablo é meu primo, filho de Percival, irmão de minha mãe, e realmente não consigo calcular o tempo que ficamos sem nos ver! Todas as memórias que tenho dele, ele era bem criança, com não mais de 10 anos de idade. E era uma criança que dava muito trabalho. Não tinha nenhum dos dentes da frente na boca, um pouco por descuido, um pouco por ser muito arteiro. Era o terror da vizinhança quando passava as férias na casa da minha avó! Muito alegre, vivia sorrindo, correndo, pulando muro e juntando aquela cambada de menino em volta pra fazer travessura. Nunca foi bem na escola e, por isso, todo mundo vivia dizendo que ele tinha algum problema. Não aprendeu a ler direito, não passava de ano. E o tempo foi passando assim, com todo mundo sempre repetindo que ele tinha algum problema...
E eis que reencontro com ele. Quase não acreditei que era a mesma pessoa! Quando não se tem contato nenhum com uma pessoa, fica na sua cabeça que o tempo parou para aquela pessoa; e quando você a revê, espera que ela esteja do mesmo jeito. Ou pelo menos parecida. Mas nunca o extremo oposto. E lá estava ele quando chegamos no dia 21: alto, com todos os dentes certinhos na boca. Quieto, muito quieto! Toda vez que sorria, era um sorriso contido, meio amarelo. Passou a maior parte do tempo apenas respondendo de forma bem econômica o que lhe era perguntado. E sempre muito educado! Fiquei pasmo... Mas as coisas não demoraram a ficar um pouco mais claras.
Fiquei sabendo então que há um bom tempo atrás, os pais dele se separaram. Nenhum dos dois é exemplo de pai e mãe, mas não convém aqui falar dos defeitos de ninguém. O que se sei é que ele tentou morar com o pai (dava mais certo com ele), mas vivia brigando com a madastra. Depois tentou morar com a mãe, mas também não deu muito certo. Ficou pulando de casa em casa, até terminar na casa da minha avó, talvez como uma última opção.
Além disso, as pessoas continuam com a mania de falar que ele tem algum problema (mesmo ninguém tentando arriscar que problema é esse): depois de chegarmos e conversarmos um pouco, ele foi para o quarto. Dizem que passa muito tempo lá. Então, fui para um banco na calçada, bem debaixo da janela da sala e comecei a conversar com o Sr. Divino, marido da minha avó (meu avô biológico morreu há muito tempo, quando minha mãe ainda era criança). Ele foi logo dizendo que o Pablo estava tomando remédio já tinha um tempo, que aquele menino não era “bom das ideias”. Se me lembro de falarem isso quando ele era criança, e se a primeira coisa que vieram me falar dele foi justamente isso, imagino que falaram isso dele a vida toda! Ora, ele não pareceu ter problema nenhum pra mim (além da evidente tristeza estampada no rosto) E, bom, a casa da minha avó tem paredes finas, não é forrada... Duvido que ele não estivesse ouvindo estando apenas a alguns metros de onde estávamos conversando. Passei a me imaginar vivendo em um lugar onde todo mundo achasse que eu não fosse normal, que vivessem dizendo isso, e que eu vez ou outra escutasse. Ia acabar acreditando. E também não ia querer sair do quarto!
Minha mãe também ficou preocupada com ele. Pegou o nome do remédio (que não me recordo) e fomos pesquisar na internet para quê ele servia. Era apenas um calmante, e minha avó de fato havia relatado que ele tinha dificuldades para dormir. Não sei quanto a vocês, mas me parece que os únicos problemas que esse garoto sempre teve foram falta de carinho e de cuidado. Passou de criança alegre e farreira para adulto triste e solitário apenas através de um mecanismo cruel de descaso e humilhação que foi triturando a autoestima dele ano após ano. O que me leva a pensar num comentário que ouvi dia desses: as pessoas deviam ter que conseguir permissão para serem pais! Melhor isso do que colocar filho no mundo e não dar a devida atenção, o mínimo de cuidado. Agora pense na quantidade de criança que não passa por situação semelhante? Ou, muitas vezes, pior?
Pobre Pablo. Fica aqui meu desejo sincero de que nesse novo lar receba o carinho que devia ter recebido desde o princípio...

2 comentários:

Unknown disse...

Post bacana Magaiver! Quando estive com a Mamãe ela me contou da triste situação do Pablo e acho que talvez ele sofra de dislexia. Estive pesquisando sobre o assunto e descobri que ele teve todos os sintomas de dislexia: dificuldade no aprendizado, na decodificação das palavras(não aprendeu a ler ou escrevia de trás para a frente), trocava sons de letras como p e b, era hiperativo... Partindo dessa premissa podemos descobrir uma forma de ajudá-lo, levando-o em algum especialista para vermos o que fazer.

Magno Santana Soares disse...

Poxa maninho! Esqueci da dislexia... Se encaixa perfeitamente na situação! E é algo completamente contornável se bem tratado. Pior foi que o calmante foi um médico de Buriti que receitou. Não entendo como ele não percebeu, ou pelo menos desconfiou! Enfim, uma situação que poderia ser evitada simplesmente com informação. Vou conversar mais com Lucinha sobre isso no fds. Abração maninho! e muito obrigado pelos comentários... é praticamente o único que comenta com freqüência! :D